Dificilmente crises conseguem surtir soluções ótimas para todos os lados. A necessidade de um encaminhamento relativamente rápido permite que acordos minimamente razoáveis para as partes sejam acertados. Além disso, crises parecem ser o momento ótimo para serem pensadas saídas de qualidade institucional mais elevadas, ou seja, comportam soluções que vão além das paliativas para serem discutidas. Esse parece ser o caso do entendimento dado entre Estados e Governo Federal. Não havia espaço para um corte unilateral de juros de 100% por dois anos como demandando pelos entes subnacionais ao mesmo tempo em que parecia difícil os mesmos aceitarem um corte total de apenas um mês com um escalonamento relativamente apertado.

Além de a solução dada estar prevista no déficit deste ano, talvez o mais importante do acordo tenha sido a incorporação da PEC do teto do gasto público também para os Estados, junto com a sinalização de que os juros simples deixarão de ser demanda dos mesmos. Se a há a percepção de que o ajuste fiscal será duro para o governo federal, nada mais justo que o caminho pedregoso seja compartilhado com os Estados.

A ideia de perder os anéis para não perder os dedos cabe perfeitamente na avaliação desse acordo. O custo de R$ 50 bilhões no seu total pode parecer uma derrota para o Governo Federal, mas essas soluções têm que sempre ser vistas pensando no que seria o caminho alternativo. Não fazer acordo ou forçar um muito duro para os Estados poderia engendrar um processo generalizado de calotes, perdas adicionais de notas soberanas das agências de rating para os mesmos e pressão para aceitação dos juros simples pelo Supremo. As perdas que poderiam ocorrer nos parecem que passariam bem mais dos R$ 50 bilhões da negociação de hoje, especialmente por acelerar uma decisão pró-juros simples por parte do Supremo. O custo adicional desse ajuste em 2017 e 2018 deve ser da ordem de 0,4 ponto percentual de elevação da dívida bruta em proporção do PIB. Mas os elementos acima em conjunto poderiam atrasar a recuperação da economia significando crescimento menor em 2017 e 2018 pelo menos, com aumento da dívida bruta em 1 ponto percentual. Ou seja, a perda relativa parece ser menor do que a alternativa de nada fazer ou fazer um acordo muito duro que não funcione.

A ideia de um acordo mais rápido com os Estados também acelera o processo de ajuste fiscal como um todo e permite que a saída da crise não fique pendurada na dificuldade na relação com os Estados. Vale lembrar que em 1999 foi justamente um calote do governo de Minas Gerais que deu o gatilho para a crise cambial, que, ademais, já se encaminhava para seu fim.

Ao acelerar esse processo, permite que a recuperação da atividade seja mais rápida, podendo diminuir o custo total do acordo. E aqui temos um ponto essencial. Tudo que possa ser feito para deixar o ajuste fiscal o mais transparente e duradouro possível será bem-vindo. A possibilidade de colocar Governo Federal e Estados no mesmo barco atrás do ajuste fiscal deve ajudar, inclusive, na aprovação da PEC do teto do gasto público pelo Congresso.

Vale lembrar que boa parte do drama que estamos passando surgiu dos efeitos deletérios das tentativas infrutíferas de burlar a LRF em escala federal. Basta pensar que se não houvesse a lei a situação fiscal estaria em condições muito piores. O mesmo vale para os estados como elemento adicional de controle fiscal para o futuro. Que o acordo seja apenas um primeiro passo em uma discussão que precisa e tem espaço para se aprofundar.

 

Artigo escrito por José Roberto Mendonça de Barros, Maria Cristina Mendonça de Barros e Sergio Vale, publicado na edição de 22 de junho de O Estado de São Paulo.

    

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